sábado, 19 de junho de 2010

Termo, segundo Jacques Maritain

1. As três operações do espírito e as três obras do espírito

O objetivo último do espírito que utiliza a razão como instrumento de ciência ou meio para a aquisição da verdade é a produção de uma obra chamada argumentação correta, a qual decorre de uma atividade racional última chamada de raciocínio. Entretanto, antes do espírito praticar tal atividade para a construção de tal obra, pratica atividades anteriores e constrói obras também anteriores, as quais são pré-requisitos para aquelas.

Jacques Maritain denomina as atividades do espírito de operações do espírito e denomina as obras produzidas por tais atividades de obras do espírito.

Neste contexto, o termo representa uma obra anterior produzida pelo espírito, que será utilizada em operações posteriores para a construção de obras posteriores. Daí porque, para entender o significado do termo é necessário, antes, que seja entendido o significado de operações do espírito e de obras do espírito.

Segundo Jacques Maritain o espírito pratica três operações e, conseqüente, em decorrência de cada uma delas, três respectivas obras são produzidas, considerando que a primeira obra é utilizada na segunda operação para a construção da segunda obra e que esta é utilizada na terceira operação para a construção da terceira e última obra. De tal ordem se conclui a dependência necessária da terceira obra em relação a segunda e desta em relação a primeira. A mesma dependência se aplica às três operações.

Quanto à obra do espírito, o autor chama a atenção para o fato de que é produzida no espírito, daí porque não é em si mesma material e sim espiritual.

Na ordem decrescente da exposição, seguem-se breves considerações sobre cada uma das operações e obras do espírito.

A terceira e última operação do espírito, conforme denominação já referida, é a operação do raciocínio. É a operação mais complexa, porque com ela utilizamos as coisas já conhecidas para chegarmos às que ainda não conhecemos, através de demonstrações, fazendo progredir a nossa ciência. Embora complexa, a operação do raciocínio é una, indivisível, pois visa exclusivamente à conclusão final. Sua estrutura é formada por duas proposições conhecidas, a partir das quais se chega a uma proposição conclusiva ainda não conhecida, sendo que este é o objetivo exclusivo do raciocínio, daí porque sua unidade está na necessária dependência da proposição conclusiva em relação às duas proposições antecedentes, e na completa inutilidade destas duas proposições para o raciocínio em questão se não houver a manifestação da proposição conclusiva.

O raciocínio produz a obra do espírito e no espírito chamada argumentação, que consiste na reunião de proposições dentro da estrutura já descrita.

O exemplo do quê a operação do raciocínio produz no espírito pode assim ser representado graficamente: destas duas proposições, todo homem é mortal e Sócrates é homem, se deduz a proposição conclusiva Sócrates é mortal.

A segunda operação do espírito, por sua vez, é o juízo, que consiste em afirmar ou negar uma coisa de outra coisa. Através da operação do juízo afirmamos a relação de identidade entre duas coisas, ou negamos a relação de identidade entre duas coisas. Assim, declaramos a posse da verdade sobre um determinado ponto. Convém, ainda, esclarecer que o juízo é também um ato uno e indivisível, pois é um movimento de pensamentos que une um sujeito a um predicado pela relação de identidade.

O juízo produz a obra do espírito e no espírito chamada proposição ou enunciado. A proposição produzida pelo espírito é a proposição pensada, isto porque a proposição falada, quer mentalmente falada quer realmente falada, é apenas o sinal oral da proposição pensada, sendo que  a diferença entre uma e outra  é similar à diferença entre uma casa e o sinal que a representa. A proposição pensada, segundo Maritain, é um organismo imaterial composto de vários conceitos; já uma proposição falada é um composto inerte de partes materiais (palavras) justapostas no tempo (oral) ou no espaço (escrita).

O exemplo do que a operação do juízo produz no espírito pode assim ser representado graficamente: todo homem é mortal.

A primeira operação do espírito, por fim, é a simples apreensão, que consiste em formar uma idéia no espírito através da qual se apreende algum objeto simples. Por este ato um objeto de pensamento é apresentado à consideração e à posse do espírito, mas apenas oferece um objeto discernível numa coisa, sem oferecer outros objetos que realmente ou possivelmente estão unidos a esta coisa, daí porque o espírito, pela simples apreensão de um objeto, não tem ainda o que afirmar ou negar sobre ele. Por isso, é um ato uno e indivisível e é também simples, pois não comporta divisão em partes, e se refere a um objeto que é indivisível em si mesmo ou é pelo menos apreendido da mesma maneira que os objetos indivisíveis, sem implicar construção edificada pelo espírito.

A simples apreensão é uma operação primeira do espírito, que não supõe qualquer outra antecedente, e ainda não representa o primeiro ato de conhecimento. Ela produz a obra do espírito chamada conceito.

 O exemplo do que a operação da simples apreensão produz no espírito pode assim ser representado graficamente: “homem”, "Sócrates" e “mortal”.

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